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Tuesday

Agnus Dei

Com a fogueira quase extinta, no meio da vasta planície o sábio sussurrou à criança:
- ...Não tenhas medo, ainda não és um homem...

Monday

Goa

O imenso campo vazio
Faz algum tempo desde que vi alguém
E a paz tão distante
Desejos guardados
O pulso treme à medida que corto
Quando chegar a altura não vou hesitar
Loucos empunham cartazes
Afirmam que o mundo acabou
Aproveito a última gota de água para me afogar
O problema do mundo sou eu
Borboletas por toda a parte
Não sei como te dizer
Mas já não te amo faz algum tempo
Como poderei eu argumentar a ausência de sentimento?
Chegada a hora de partir
Resta-me escolher a porta correcta
Uma forma digna de me despedir de mim

Tuesday

Manifesto nº 1

Tudo é arbitrário
Seja no momento em que nasces
Em que dás o primeiro beijo
Em que decides que é aquela pessoa com que vais passar o resto do teus dias
Em que te apercebes da vulgaridade da nudez
E finalmente acabas por te enjoar do cheiro azedo do sexo
Nos momentos em que estás sozinho
Quando estás rodeado de amigos que não conheces
Quando te julgas imortal e o mundo é teu
Quando sonhas com o dinheiro, a fama e a consequente luxuria
E depois
Nada existe por um segundo
E esse segundo és tu
Num universo onde não existe meio
Nem inicio
Nem fim
O acaso acabará sempre por vencer a batalha das certezas
E quando atingirmos a sabedoria saberemos admitir que somos ignorantes
Inocentes como no primeiro dia, com a pele um pouco mais enrrugada
Esta é a minha verdade, que nunca escreverão em livros, nem tão pouco será recordada posteriormente
São palavras
Sem sentido
Facilmente manipuláveis
E todos nós
Sem excepção
Somos escravos das palavras

Thursday

Romance

Ela disse:
- Estou farta das tuas inseguranças, de não saber se te vou ter amanhã, de viver no eterno medo de te perder
Ele respondeu:
- Prefiro viver na insegurança, do que te ter na minha mente para o resto dos meus dias, porque o amanhã não existe, e hoje vai ser para sempre

Ela esvaziou o copo de água num só gole, levantou-se da mesa e foi-se embora para nunca mais voltar.
Ele permaneceu inerte, olhos no horizonte, a admirar o pôr do sol. Nunca voltaria a amar ninguém como ela.

Wednesday

Pensamento nº 1

Será que alguém, alguma vez, em algum lugar, terá dito algo que só tenha feito sentido para ela própria e mais ninguém?

Tuesday

E agora?

Mais ou menos eternamente
Nem que seja por um minuto
Aceno para dizer adeus
Preso na realidade inteira
Não vejo o sol faz já algumas semanas
E as noites parecem nunca acabar
A chuva que cai na soleira da porta
Prometo que não vou olhar para trás
Que vou ser meu para sempre
...A dúvida...
...Diluída...
Vou-te oferecer as minhas lágrimas
Embrulhadas no mais bonito dos papeis
Para que possas ver
O teu rosto reflectido intermitentemente
Nas ondas criadas pelo teu respirar

Thursday

Horas vagas

Está quase a acabar
Dá-me só mais um minuto
Uma nota escrita no ombro do amor
Nada faz mais sentido
Levanta-te e dorme até ficares melhor
Multidão perdida na rua sem fim
Tenho de mudar algo para melhor
Tudo para nada, esqueci-me num segundo
Prioridades à parte, e voltas a existir
Foge incerto, para sempre
Laminado como a lua, doce como o sal
Viajei três dias para envelhecer seis anos
E tudo porque acreditei que estarias ao acordar
Cada um por si até ao final
Uma noite de verão extinta
Um filme já visto à beira mar
Permanecemos no mesmo lugar, observando o movimento
Irónica como a metáfora da existência
Mas leve como a brisa que nos move indefinitivamente
Sorri porque amanhã será certamente pior
Porque afinal o dia não foi assim tão mau
A infelicidade só existe para que possas sonhar
E a esperança já morreu à demasiado tempo
Levei a mão ao peito, o coração deixou de bater
A banheira acolhe o corpo inerte
Os olhos fixam o tecto
Não sei o que pensar
Continuo a viver para sempre
Até ao fim

Saturday

Rascunho nº5

Constelações incompletas fazem o céu apagar
As nuvens trémulas das viagens perdidas
Tentei seguir-te até ao outro lado do tempo
Mas por entre dúvidas e a porta do celeiro
Aberta, hesitante, longa, doce
As fileiras de soldados, abatidos por dó
Os corpos mutilados, entrelaçados para sempre
E o mundo que continua a rodar, na sua implacável beleza
Conversas de pátio, lembranças furtadas, saliva
Não posso continuar, tenho de seguir a razão
Carregar o ocaso até ao seu estado primário
Atingir o nível a que me submeti
Acreditar no bem maior do ser
A lista telefónica, agora rasurada
Dá lugar ás inevitáveis perguntas
Para as quais não há respostas
Não fosse a óbvia mentira
Teria sido belo

Thursday

...E das ruínas da cidade, surgem anjos feridos

Sento-me ao teu lado no chão irregular
Ignorando as palavras que tardam em chegar
És o fantasma possível de um mundo virtual
Fixas a colina que desfaz o horizonte linear
Observas a criança que balouça no ramo frágil
A árvore milenar
O sol cega-me a alma por instantes
E naquele momento desejava poder respirar o vento
Absorver as flores que teimam em crescer no alcatrão
Que tudo tende em desaparecer eventualmente
A não ser que abras os braços em direcção ao céu
E sejas o milagre impossível de anos de espera
Por momentos temo que desapareças de vez
Mas a sensação não dura mais que um pestanejar
E é tão bom poderes acreditar no que vês
A honestidade imperceptível do momento
Dissolve a realidade aparente
E finalmente consegues entender
Como é fácil voar sem que asas te nasçam
Ladeada por momentos que te tornam no que és
Amanhã de manhã já cá não estarei para deixa nascer
Urgência num dia intemporal
Dás-me um papel amarrotado que ambos sabemos o que é
Interrompemos a rotina para que possamos sonhar
Acreditas, ages para sempre, deixas viver
Montanhas que ruem ao som de suspiros
Amantes que conspiram o próximo beijo na utopia certa
De que o dia seguinte será só mais uma etapa fugaz
O caminho para o mundo perfeito, a incógnita constante, a palma da tua mão

Wednesday

Moinhos movidos pelo som eterno da fuga

Fechado por breves instantes no quarto
A tua face vincada pela beleza eficaz
O espelho não se cansa de reflectir a imagem
De algo que tu nunca serás
A imperfeição mais perfeita
A troca
Por momentos esqueci-me de mim
Só o teu hálito existia
E o sorriso treinado
Por infindáveis anos de procura
Embriagado pela tua energia
Deixei-me levar ao fim
Implodi para sempre naquele momento
E o abraço final serviu de consolação
A beleza esconde-se em planos improváveis
Agora já do lado de fora da porta do quarto
Resta-me esquecer a morada
Inventar artificios imersos
E reviver o beijo imaginário

Monday

Urza azul

E tudo recomeça de novo
Outro dia, a mesma história
Ver as mesmas pessoas
Dizer as mesmas palavras
O que não daria por uma surpresa diária
Que quebrasse a dormência da alma
E me fizesse acreditar no amanhã
Todos os dias morro um pouco
Caminhada firme para o funeral
Leite com chocolate para o pequeno almoço
Cigarros como sobremesa
O frio da rua que me leva ao destino
A vontade de voltar para trás
De fugir para longe, explorar o mundo
Implodir com ele
Preciso de encontrar um desvio urgentemente
Planear a fuga antes que seja tarde demais
...Até lá
Respira fundo
Continua a fingir
Constroi reinos fictícios
Continua a fingir
Sorri para o homem de negro
Continua a fingir
Socializa
Continua a fingir
...E o dia acabará por terminar

Thursday

Divisão

O dia estava demasiado quente para fugir
Eu instalado no quarto da minha mente
A formular sonhos que nunca tive
Uma chávena de café manter-me-á acordado certamente
O tempo vazio, fácil, acetinado
Transporta-me de volta á origem
Por vezes é difícil não me arrepender de mim
Ao vêr que a rotina continua indefinitivamente
Que continuo a ter o mesmo que sempre tive
O dia arrefeceu, mas permaneci
Observei a mudança de estação
Permaneci inerte
E deixei que tudo se movesse em meu redor
A beleza fluiu, como um copo de água em queda permanente
Nem sempre é fácil aceitar o fim do verão
Mas é na fina membrana que o separa do inverno
Que reside a resposta para a mudança
Abri a porta, e abandonei o quarto

Monday

3 Linhas

Num tempo em que não vivi
Num espaço que nunca tive
Está uma parte do que sou

Friday

18:02

A aventura surge da vontade
Adormecida por tanto tempo
Gotejante, a feroz inércia
Safari, cigarros e um copo de água
O papel de parede em espiral
A hipnose salvou-me
De tanto tentar consegui
O sabor agridoce da verdade
O sofá pode esperar por mais uns minutos
Por agora prefiro manter
E soltar as correntes
Que me prendem ao Óasis
Não ser
A ultima liberdade
A fronteira inultrapassável

Wednesday

Arco-Iris

Histórias simples
Amanhã queres ser de quem deus quiser
Vendes-te a alma por prazer
Caminhas na linha incerta do pseudo coração
Queres respirar mas o mundo sufoca-te
E no momento em que a queda chegar
Verás o chão de perto
A relatividade da realidade
Que somos humanos, e propensos a errar
Que a imortalidade pertence ao tempo
Nada podes fazer para o mudar
Auto interpretação
A morte dum anjo é sempre de lamentar
Mas a ascenção de um demónio é mais vulgar
Hoje vou ser aquilo que não me deixas-te ser
O despertar do carnal
Da não repressão
...O belo

Monday

A solução

Já não és aquilo que eu julgava seres
Não passas de uma mancha diluída
De uma nódua esbatida
Pelo tempo que passou por ti
O engano é inevitável
A regressão evidente
A lâmina acabará por cortar
O que resta da corda gasta
Aproveita enquanto toca esta canção
E dança até á exaustão do ventre
O dia há-de chegar
E o chão acabará por ruir

Saturday

Invencível

E se amanhã não me encontrares
Talvez seja porque já cá não estou
Ontem a noite choveram flores
E eu não resisti á tentacão da côr
Memórias antigas, o relógio dispara
Está quase na hora, ignora por agora
A velocidade imensa do tempo
A ferrugem no barco, prestes a afundar
Visita a praia onde te deixei
Respira o mar, absorve a areia
És o luar, quero que te lembres de mim
Como da ultima vez
A vida é a aventura da queda
Interminável sonho acordado
Enrolo os dedos em torno do anel
Jamais serei aquele que mendiga o teu sorriso
Por agora escrevo o que sinto
Até que um dia o fim seja certo
Mas enquanto viver em mim
E me conseguir sentir
Serei para sempre invencível

Thursday

Simples como respirar

Olha para mim
Como eu nunca consegui
Acerta no reflexo que é teu
Porque há vida nos actos invisiveis
Recebe a arma como combinado
E comanda o mundo
Nem que seja por uma fracção de segundo
O arranha céus pintado de branco
Um passo em frente, só para saber que estou vivo
O som dos pianos no hall iluminado
Imensa orquestra escondida
Eterna camâra lenta
As árvores, o cheiro acabado de nascer, és tudo
Quero acreditar que sou bom
Mas todos os dias me mato um pouco
Sou o hómicida inocente, das palavras sem sentido
E todos os dias o Sol nasce de novo
Por vezes acontece o milagre do calor, do teu corpo encostado ao meu
Mas por agora estou bem
Prefiro a solidão do conhecimento
Que a bela vertigem do amor
Porque ambos sabemos que um dia irá acabar
Aceita o facto, ignora a corrente

Sunday

Quase

Faz morrer o heroi que há em mim
Não vale a pena acreditar mais
Atiro a espada ao chão
E o som abafado da queda na lama
Faz-me acreditar que o destino é certo
O sabor do sangue é sempre melhor
Que horas são no outro lado do mundo?
Cego com a razão que criei
Vingo a minha morte com um grito mudo
Consegues sentir-me do outro lado da cama?
Por entre nuvens baixas, evito respirar
Mas eu acordo a cada dia
Com a certeza de ainda estar a dormir
E na solidão nasço outra vez
Para um mundo só meu
Para um mundo que sou eu
E agora já sei quem sou
Não sou a sombra esquiva na soleira da porta
Sou a luz eterna de uma vela apagada
Acredita em mim, mesmo que minta
Pois a verdade é fugaz
E amanhã já não me lembro
E o medo...
O medo é a condição eterna

Thursday

E depois...

Voltei por tempo inderteminado
Voltei para ver se ainda significa
E todas estas coisas ao mesmo tempo
Algum dia hão-de fazer sentido
Não estou confuso!!!
É apenas o facto de viver
De sentir o cheiro das pessoas na rua
De as ver caminhar para o fim
...Porque sim...
Provavelmente sou eu que estou errado
O mais certo é toda a gente estar
Mas quem se importa afinal?
Temos uma ânsia tão grande de viver
Que regra geral deixámos passar a vida ao lado
E continuámos a brincar em castelos de areia
Prestes a ceder, como lágrimas emprestadas
Na mão esquerda a tesoura aberta
Reflecte fragmentos do meu passado
Na direita o cordão umbilical húmido
O corte é certo
A dôr vem depois

Tuesday

6

Desejo voltar a ser o que era
No inicio era doce
Procurei a ligação entre as partes
E fugi na linha de metro
Sem luz, gotejante
Dia fácil, noite melhor
A barreira invisível, membrana danificada
Que lado escolher
Dualidades fora do prazo
Açucar no chá, mel no café
A solidão faz de nós homens, se estivermos dispostos a arriscar tudo
Cadillac de portas abertas
Convido-te para entrar
Desapareço na metamorfose prestes a suceder
A casa de areia prestes a ceder
Todos os sonhos nascem no fim
Nada é o que parece ser
Doce vertigem na torre de vigia
E a tua queda, tão denunciada...
...Prestes a acontecer

Saturday

Sal?

Fixo a janela semi aberta e pergunto-me
Quantas pessoas terão deixado esta casa?
Quantos lagrimas, sorrisos e despedidas terão presenciado estas paredes?
Nuas como no ínicio
Quase como quando a vi pela primeira vez
E na hora do adeus recorro á nostalgia como comprimido
Deixei de ter medo das coisas que não posso controlar
Talvez...Nem sei
É fim da tarde como no principio
A luz incide no chão do corredor
As palmeiras agitam-se ao sabor do vento
O sacristão fala sozinho enquanto fecha a igreja
Mas falta uma parte de mim que não sou eu
...Levanto-me da cadeira
...Fecho a porta
...Para nunca mais voltar

Adão e Eva

Fotografia N. Cava. Todos os direitos reservados.
(Adão e Eva)

Improviso solitário de uma cegonha a colidir com o tempo

O mel transborda do mosaico enquadrado
O reflexo da luz na mesa de apoio
A necessidade de sentir o presente interminável
De obter as respostas, desconhecer as questões
Sinto-me vago
Uma nuvem prestes a acontecer
O paredão em ruínas do meu passado exemplar
Respiro um suspiro prestes a colidir
Esqueço os momentos que me prendem ao ínicio
E sinto-me uno com o imenso amor do meu potêncial
Sei quem tu és, mas não me conheço
Desejo-te a luz que nunca te pude oferecer
Sonho imenso, ainda que inacabado
Pertence as paredes dos templos dos nossos antepassados
Não existem fronteiras para esta semelhança
E o teatro improvisado arde ao sabor das cinzas
...O vento é meu aliado
Vórtice, paradigma, distância
Agradecimentos, desculpas e adeus

Wednesday

A árvore rachada no cimo da colina - (Protótipo de um poema)

A erva queimada, o sol penetra o chão
O calor imenso do momento acabado
Enquanto o vento canta a sua canção
A curiosidade paira, monta o cavalo alado

Entras na porta, atravessas o risco pintado na entrada
Foges por caminhos que julgavas extintos
E sentes a tua consciência pura para sempre amarrrada
Abre os olhos e encontra a saída destes infindáveis labirintos

Rasga o poema, a corda solta
Inventa uma rima, e outra, e outra
Não desistas do tempo que tenho para te dar
E no fim de contas, é a nossa sina sonhar

Vivemos o nosso inverno noutra estação
Entre montes de erva daninha e pudor
Enganámos amigos, demolimos a prisão
Queimamos caixas de fósforos, protegendo o amor

E afinal marquei o meu nome em todas as folhas
Caídas no chão molhado pelos suspiros ternos e lágrimas perdidas
Desisti da poesia, das rimas e de toda uma realidade
Para me descobrir nas ondas que matam as sereias de prata

Um homem partiu ao som das sirenas, tornou-se criança e jamais voltou

Tuesday

Atrasado

A glória concentrada num pedaço de céu
O equívoco urgente do meu esquecimento
Há sempre um desejo, uma história recente
Para que tudo possa fazer sentido
Acorda a noite está prestes a chegar
E com ela a fábula nómada, o beijo fugaz
Eu sou aquele que te afaga a mão
Que vive em silêncio para te provocar
Por onde andarão os anos dourados?
Em que nada sabia e governava o mundo
Desejo o suor da tua dôr, como o copo de água em queda
A cascata congelada, o gelo manchado
E limitamo-nos a ser a farsa
A viver, morrer e matar por ela
No fim dos dias o que restará de nós?
A sombra tardia?
O esquecimento global?
Ou a cerimónia respeitável?
Precisamos de viver sôfregamente
Extrair o sumo da nossa essência
Porque nem sempre o fim é um novo começo
E por fim possuir a nossa consciência

Sunday

6:29

Estou perto do fim
A rua estreita reflecte o que resta de mim
O medo das decisões anónimas
Da noite dourada
Dos estranhos que vivem em mim
Da familia que me fechou a porta de casa
Vou ter de mergulhar, e arriscar a queda
Vou ter de viver plenamente
O amor sabe melhor pela manhã
Nunca pensei que fosse assim
Prefiro ser considerado um louco
Que viver confinado num espaço que não é meu
Demasiado pessoal
Decidi contar a toda a gente
Exprimi os meus desenhos na tua cara de cera
Saltando de pedra em pedra sem chão onde me apoiar
Iludi o padre na igreja
Lancei dados partidos sem esperança de ganhar
Ultimei os preparativos para que a cerimónia se pudesse realizar
Suspira por mim, pois já nada resta
A não ser a sombra perdida de alguém que já nada pode dar
O verão sempre foi a estação em que eu sempre desejei parar

Wednesday

Barbie

Duradoura vénia ao palhaço da corte
A raiz do medo dos homens
A alface apodrece no frigorifico
E todo aquele dinheiro gasto no vício
Só para poder ganhar o ídolo dourado
A vitória pessoal da derrota dos outros
O síndrome do consumismo
O sonho da vida entrelaçada
A chamada telefónica interrompeu o jantar familiar
O silêncio quebrado por aquela voz
E de repente tudo se torna perfeito
Não é o som, nem tão pouco o choro da criança
Parece ser a luz, que passa por esta janela
Que me alivia o corpo e me envolve na sua timidez
Desligo o telefone, já nada mais importa
Volto para a mesa, não sem antes contemplar a paisagem mais uns instantes
Fecho os olhos e volto as costas a luz
...O choro parou

Monday

Outra vez...

Dualidades, o paradigma imenso
Não compreendo o porquê de fazer aquilo que não me agrada
De livre vontade
Consciência pesada
O amor bateu na janela num doce toque
E nada voltou a ser o mesmo

Saturday

Medito de fronte ao rio, que afinal sou eu

Tudo é suave
Estou deitado nos braços de uma imensa multidão
E não caio
Flutuo
Posso mudar o mundo
Acredito
Em ti
Na multidão
No extâse rosa
Na hora tardia
No copo vazio

Friday

3D

Fácil como inspirar o ar rarefeito da minha cidade, ao toque final ela mentiu

Doce veneno, ruas de feltro e a predisposição para voar
Já faz tanto tempo que não te via, a tua imagem estratificada, a posição fetal
Ouve o momento, retira o teu dedo para que eu possa ir....
Nunca dizes a verdade 
Se ao menos pudesse sair do jogo, e viver a minha vida debaixo da terra
Agora não é possivel e eu compreendo que queiras sair mais cedo
Ao quinto toque da campainha, abri a porta e não vi ninguém, fechei a janela, plantei a semente e dei voltas a mesa antes do jantar
Sou tão feliz por esta existência ciclica, pelos padres que matam com a palavra uma religião imortal
Dogma?Dúvida?Divida?
Abre os olhos! 
Vê se há nuvens no céu que resistam ao nosso peso
E arranja finalmente coragem para chorar
O tempo esgotou-se
O combate terminou
Inicia a tua viagem e não olhes para trás
 

Thursday

Já fui inocente. Agora sou culpado

Não posso dizer que sim
Não posso dizer que não
Tenho a certeza que nada voltará a ser como dantes
Junta-te a mim e tornarei-te imortal
Luxuria escondida, verdade improvável
Sinto o calor do sol ampliado pelo vidro duplo na minha perna
Não posso pensar
Não posso agir
E já é noite cerrada, tenho a certeza que não me consegues ver
Se ao menos o teu cheiro fosse menos intenso, poderia fingir que não existias
Estou a ser vigiado pelos meus próprios olhos
E não consigo encontrar um lugar onde me esconder

Tuesday

A casa de campo

Tudo roda, tudo estagna no ponto que há-de vir.
Eles vão encontrar-nos! É uma questão de tempo. E depois o que será feito de nós?
Sinto a minha sanidade por um fio.
E a queda, a iminente queda na escuridão de um ponto.
Levantei-me da mesa sem pedir permissão e fui observar as estrelas para a varanda, os cães ladravam ao som do piano que se fazia ouvir de forma pouco constante, preenchiam os vazios causados pelo silêncio, que estranha melodia aquela, na atmosfera rural de uma casa isolada no campo.
E está quase a chegar, sinto o chão a fugir, o corpo e a mente a vacilar, tudo deixa de estar provido de significado, e sem que nada possa fazer, começo a cair. Não vejo nada, estou rodeado de um negro profundo, apenas sinto o vento na cara e o corpo a deslocar-se, não vejo o chão, tento olhar para cima, mas as estrelas também desapareceram.
Estou preso nesta queda constante.
Para sempre neste lugar.
Absoluto.

Sunday

2164 \/\/\/\/\/\/\/\/\/ 2164

O meu coração continua a bater, embora nada signifique. Estou preso entre o terno tédio e o profundo extâse branco. Será que me consegues ouvir? Certamente que não.
Bloqueios mentais constantes, divergências irreconciliáveis, os amigos que enterrei naquela tarde de inverno, e que jamais verei.
O meu amor mora na porta ao lado, é meu vizinho e fingi não o ver, mas hoje decidi tirar a venda que me cobriu os olhos durante tanto tempo, e a luz do sol cegou-me.
Passeios a beira rio, ainda falta muito tempo para te poder sentir, não há nada a fazer, é inutil resistir.
O bosque sagrado, o significado de uma mão, este calor sufocante, a imagem intermitente projectada na minha boca. Por quanto tempo faremos parte deste sonho de verão?
Dois corpos desintegram-se, á medida que o vento os espalha pela nocturna cidade, os amantes observam, luxuriante invasão de um som nunca antes escutado, eu acredito em ti, tanto como nas farsas burlescas de um teatro experimental.
Não há palavras.
Não há ausência.
Tudo se resume a um muro no meio do caminho, ao suor do corpo...
Hoje carreguei a arma, e por pouco não a disparei.
Tiro certeiro do outro lado da mancha, que por momentos pensei seres tu.
Estou tão feliz que tudo não passe da minha imaginação, á medida que o copo meio vazio faz a sua ultima viagem em direcção ao chão.
Está tudo iluminado.
Como é lindo esse sorriso.
É um prazer conhecer-te.
Como te chamas?
Já não me esqueço mais.
Verdades empacotadas em cima de um divã, para sempre esquecidas, ocasionalmente recortadas.

Saturday

Quando o cego vê e o surdo ouve, o mu(n)do tem que falar.

Fúrias distantes, intrépida oportunidade, o dia de amanhã foi sempre melhor.
Ecos distantes de uma paixão juvenil, num quadro perfeito onde não existe dôr.
Acaba o chávena de chá antes que seja verão, e os grifos nos pórticos sussurrem teu nome.
Hoje não me acredito nas verdades dos jornais, tenho o céu da boca em ferida e o sabor do sangue foi sempre melhor.
Quantos dias ainda tenho de esperar até ao pôr do sol?
Filosofia inacabada de uma pressão constante, espreito na porta onde me viste entrar, onde um é pouco, e dois são demais, e afinal o dom acabou por passar, e o que viste foi só uma efeito fugaz.
Dá-me so mais um minuto até acabar, e prometo-te um mundo que não te posso dar, o tempo é escasso, eu sei, está quase a terminar.
Vejo-te na festa? Ou será demasiado cedo para comemorar?
O cavalo negro, o castelo em ruínas e o bosque ardido foram só algumas das razões. Mas eu sempre acreditei que um dia fosse demais, e além de tudo que sempre existiu, há razões de sobra para que possa viver só mais um pouco na ténue dúvida que sou.
Arrasta o corpo, desimpede o caminho, pois agora é tarde para poder falar.

Thursday

O samurai azul

O samurai azul envelheceu com o tempo perdido de uma vida dedicada à morte, vagueou por aldeias e vilas, por montes e planicies, procurava um rival, um significado para a mente desgastada. Parou um momento para apreciar o som que o vento produzia numa oliveira, e ali ficou por dois dias à espera do verdadeiro significado, não do vento, nem sequer da oliveira, mas sim da globlalidade do esquecimento, das muitas guerras travadas, e da origem do céu.
No terceiro dia prosseguiu viagem, seguiu para norte. Olhou para o seu lado direito e avistou um abutre, e com a delicadeza apenas possivel aos da sua espécie, sacou da espada e cortou o pulso direito, estendendo o braço para o animal saciar a sua sede.
Continuando a sua demanda, parou a frente de um arbusto e pegou-lhe fogo, observou o espectáculo e retomou a caminhada.
No iniciu do sexto dia, depois de quase uma semana a caminhar, decidiu parar na berma da estrada, sentando-se numa pedra para o efeito, e foi com admiração que viu um homem sentado de forma quase simétrica a sua frente, estudou-o durante alguns minutos, viu nele o adversário que sempre procurara, sentiu que era ele o seu verdadeiro e único inimigo, numa fracção de segundo sacou e atirou a espada em direcção do peito do inimigo, o som que se verificou a seguir foi como o do vidro a partir em mil pedaços, o samurai levantou-se, atravessou a estrada até ao outro extremo, e observou meticulosamente os fragmentos do espelho partido, baixou-se, colheu sua espada com a mão esquerda e um pedaço de espelho com a outra, e com singela violência muda espetou o pequeno fragmento junto de seu coração.
Caíu subitamente no chão em chamas, banhado pelo sol do meio-dia.
Abram alas pois o samurai, morreu.

Tuesday

Roldanas acabadas de quebrar

Mas afinal onde estão os exércitos dourados prometidos?Onde fica a rua errante onde pobres vendem a alma em troco de um refrão?

Visitei a luz faz já algum tempo, mas não encontrei a porta que se tarda em abrir. Fingi acreditar na melodia errante que provinha do luar, e ao som do grito abafado chorei torrentes de lava que invadiram as ruas da cidade. Ao fim do dia não restava ninguém a não ser eu, as ruas desertas, e esperança vaga que tudo não passasse de uma lírica ilusão perdida.

Mas o fim não chegou. E como uma alma perdida procura uma fuga para um reino melhor, eu mergulhei no rio de água salgada, ou talvez fosse o mar.

E assim encontrei o fim. Não o da ilusão, ou até do dia, mas do meu próprio ser. 

Hoje

Hoje acordei ao som de uma musica na minha cabeça, uma canção sobre não estar aqui, de outros lugares paralelamente universais, da ausência do Eu, e do peso de algo aparentemente oculto, mas que ao mesmo tempo senti ser real.

Hoje experimentei a diferença, por momentos deixei de ser, e penetrei no desconhecido onde era os dois, Homem e Mulher, o som e o silêncio, o quadro e a fotografia, fui a totalidade e acabei por me anular.

Hoje rezei para que não houvessem religiões, para que o homem se liberte da escravatura dos padres e dos deuses, e para que renasça com o poder que criou, da fantasia eternamente fugaz ao esquecimento total em menos de um segundo.

Hoje foi o ultimo dia antes de amanhã.

Monday

"The Absence of a Wall"?

A cair sem ter uma parede onde me apoiar.
A parede que me falta é aquela que não é de cariz imaginário, se bem que é uma parede constante, um porto seguro e um obstáculo.
Tudo é limitativo.E muitas das vezes temos dilemas existênciais.Será melhor viver seguro e limitado? Ou então inseguro e livre?
Durante muito tempo vivi entre paredes. Fazia parte delas, de certa forma era eu mesmo uma parede, era o protótipo da segurança, inquebrável, até que um dia decidi abandonar esse lugar e de repente tudo deixou de ser cinzento, os dias eram maiores , com o sol como uma constante.
Vivi feliz , sonhei, e acima de tudo amei.
Até que um dia sem que eu me apercebesse que estava a viver um sonho, tudo acabou, o despertador tocou e eu acordei, exactamente no lugar onde tinha embarcado inicialmente ,os dias voltaram a ser cinzentos e mais curtos, tudo estava e era, como devia ser, com a excepcão da parede onde sempre vivi, aquela parede que era eu.
Todos dias me pergunto.
Será que fui eu que me perdi ou a parede que desapareceu?